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Maren Morris tem três palavras para os haters do Twitter. Elas não são “eu te amo”
Em seu novo álbum, Humble Quest, a estrela do crossover country-pop equilibra humildade com saber “que você é foda”
por Jon Freeman
Maren Morris só queria tirar uma noite de folga da onda de críticas – e pior – online que ela encontra regularmente. Dois dias depois do ACM Awards 2022, onde ela estreou Circles Around This Town ao vivo, Morris enviou um tweet para as “falsas católicas Karen com pescoço de peru” que enchem suas menções quando ela se posiciona sobre um problema importante ou ousa mostrar um pouco de pele em suas redes sociais. “Vocês me mantêm jovem”, escreveu ela com um emoji mandando beijo.
“Estava começando a me irritar” diz Morris. “Eu estou aqui, vivendo meu propósito, fazendo música e tentando me conectar com as pessoas. E existe esse canto estranho e sombrio da internet que me vê como um alvo. Eu só queria rir disso naquela noite e ficar tipo ‘Vão se foder’. Vocês vão achar um problema comigo literalmente respirando. Então eu só vou falar sem meias palavras para vocês se ferrarem”.
Hoje, Maren está bebericando café gelado em um quarto no recém aberto SoHo House em Nashville, o hotel/clube social no bairro Wedgewood-Houston da cidade. A decoração cinza e bege está contrastando com Morris pronta para a passarela, ostentando uma franja nova em um suéter rosa e uma calça preta boca de sino com um toque de rosa pink irradiando do canto dos olhos.
Morris poderia ser desculpada por querer um momento para respirar e até mesmo comemorar. Os últimos 2 anos, mais ou menos, foram um período de constantes e, às vezes, enormes mudanças para a cantora e compositora, cujo o hit estreante My Church foi lançado em tempos muito mais normais em 2016.
Para começar, ela deu à luz ao seu filho Hayes, com o cantor e compositor Ryan Hurd, em março de 2020, enquanto o mundo inteiro estava se fechando devido à pandemia. Dias antes, ela tinha feito uma performance marcante no Rodeo Houston, um evento gigantesco em seu estado natal, Texas. Ela estava grávida de 9 meses e tentando evitar uma queda no palco rotatório, mas ela encontrou força – e equilíbrio – para continuar. Quase dois anos depois, ela fez um retorno triunfante ao Rodeo e, dessa vez, se sentiu um pouco mais livre. “Parecia um show de comeback”, disse ela. “Voltar e não ter que lutar para respirar e cantar – porque eu não estava grávida de nove meses –, foi muito mais fácil dessa vez”.
No início da pandemia, o single de Morris, The Bones [do álbum GIRL] se tornou um hit crossover que passou 2 semanas em número 1 nas paradas das rádios country em 2020 – a primeira música por uma mulher a alcançar isso em mais de 8 anos. Mais tarde, chegou ao número 12 na lista Billboard Hot 100 de todos os gêneros. Ela não pôde comemorar direito com os fãs, já que a turnê chegou a um impasse e os protocolos de distanciamento social eram a norma na época.
Virar mãe trouxe novas revelações também. Morris percebeu que não tinha entrado em luto completamente pela morte do colaborador e produtor Busbee em setembro de 2019, que tinha defendido o trabalho inicial dela e produzido seu primeiro álbum, Hero, assim como boa parte do GIRL. Para variar, a cantora e compositora nata não estava focada em escrever, nem performar.
“Eu estava obviamente passando pelos estágios iniciais da depressão pós-parto e depois o luto que eu não tinha processado completamente de perder Busbee” disse ela. “A música só não estava no plano principal da minha mente naquele momento”.
A necessidade de escrever músicas voltou em certo momento e Morris recorreu ao produtor-compositor Greg Kurstin (Adele, Kelly Clarkson), que tinha co-escrito e produzido a faixa-título do álbum GIRL, assim como Common e The Bones. Ela enviou uma demo bruta de Circles Around This Town, uma música sobre a luta incessante de escrever músicas e deixar uma marca em Nashville que tinha ecos do hit My Church assim como algo novo – um toque orgânico, metálico e original – que Morris queria explorar.
“Nós começamos a conversar e eu lembro que ela estava brincando, tipo, ‘nós estamos fazendo um álbum de rock?’”, Kurstin recorda aquelas primeiras conversas. “Eu estava animado com a direção. Eu tinha algumas ideias de onde poderíamos ir, mas essas músicas realmente solidificaram a direção para mim, ouvir essas demos.”
O novo álbum de Morris, Humble Quest, não acabou sendo exatamente um projeto de rock, mas existe uma presença inegável de uma guitarra energética ao longo dele, assim como uma sensação leve e relaxada de muitas músicas. É uma mudança notável da produção mais elaborada e influenciada pelo ritmo R&B que permeava GIRL.
Gravado parcialmente no estúdio caseiro de Kurstin no Havaí, com gravações adicionais no estúdio de celeiro da cantora Sheryl Crow em Nashville (“Foi realmente uma colcha de retalhos. Nós fizemos acontecer em um longo período de tempo em diferentes cidades”, disse Morris), Humble Quest reflete a mentalidade de Morris através de um período tumultuado, apesar de, felizmente, não haver nenhuma referência explícita ao coronavírus.
“Não é um álbum com tema da pandemia, mas foi absolutamente criado durante uma época de muita incerteza para mim como mãe, como mulher, como uma artista que quer cuidar de sua banda e equipe que trabalhou tão duro, para mantê-los com um salário” disse ela. “Não tem músicas de COVID, mas foi feito durante uma época em que muitas merdas reais aconteceram comigo e com o mundo”.
Em vez disso, existe um clima de luta contra a instabilidade, de procurar por conforto na união e no companheirismo, que impede o projeto de cair no território “tudo está fodido”.
“Eu não queria me demorar em temas muito deprimentes” diz Morris. “Eu acho que os álbuns que me tiraram da minha depressão durando a pandemia foram os álbuns realmente animados”. Ela cita o Future Nostalgia de Dua Lipa como um favorito de tempos em tempos. “Eu não vou sair e fazer um álbum dance-pop, mas se eu vou virar o satélite da minha música em direção ao mundo nessa época tão caótica e pesada, eu quero que seja leve”.
A faixa título mostra Morris olhando no espelho, tendo um acerto de contas com a incerteza sobre ela mesma e aquelas menções online dolorosas. “The line between fulfilled and full of myself/I’m trying to find it and I might need some help” canta ela. Morris está presa entre a luta para se posicionar e dizer algo e o coro de pessoas falando para ela se calar quando ela fala.
“Eu estava vendo críticas online sobre eu parecer cheia de mim, muito confiante ou tipo ‘quem ela pensa que é? Ela obviamente esqueceu de onde veio’” diz ela. “Eu comecei a me questionar, tipo, ‘será que eu esqueci?’”
Morris também traz o senso de humor astuto que fez Drunk Girls Don’t Cry e 80’s Mercedes tão envolvente em músicas como Tall Guys, que faz referência a seu marido longilíneo, Hurd, assim como muitos homens. “Eu tenho 1,54m então todo mundo é mais alto que eu” diz ela. Hurd também co-escreveu I Can’t Love You Anymore, um número levado pelo ritmo que mostra a habilidade de Morris em cantar clássicas melodias do country e também abusa de jogos de palavras clássicos no country para bagunçar o significado do título da música.
“Eu penso em John Prine e Iris Dement cantando ‘In Spite of Ourselves’ e Loretta e Conway cantando ‘You’re the Reason Our Kids Are Ugly’” diz Morris. “Essas músicas sempre pareceram as músicas de amor mais reais porque elas me faziam rir.”
“Na minha cabeça, eu estava pensando naquela batida em alguns daqueles álbuns do Willie Nelson dos anos 70”, Kurstin explica sobre a melodia leve e impregnado de pedal steel. “É, definitivamente, uma das músicas ‘mais country’ em que eu já travabalhei.”
Morris compõe generosamente sobre seu relacionamento com Hurd, que conseguiu seu primeiro número 1 como artista com Chasing After You recentemente. Existe um relato lamentoso dos dois músicos em turnê e sentindo falta um do outro em Furthest Thing, um lindo hino de devoção e até-que-a-morte-nos-separe em Background Music e uma potente descrição de excitação em Nervous. A última música é uma balada no piano em que ela pergunta “o que seria do mundo” se ele não existisse. O filho de Morris e Hurd, Hayes, também faz sua estreia no topo da suave Hummingbird; que Morris escreveu no dia em que ela descobriu que seria mãe.
Para ninguém pensar que ela está compartilhando demais, Morris promete que existem músicas que ela e Hurd escreveram que não são para consumo público.
“Existem algumas músicas que nós escrevemos separadamente ou juntos que nunca chegarão aos ouvidos dos fãs porque foram feitas para a gente e não para o mundo ouvir” diz ela.
Compor músicas continua no centro do que Morris faz. Ela passa horas com suas amigas e colaboradoras tentando ouvir suas últimas e melhores demos, assim como quem está indo bem. “Natalie [Hemby] e eu chamamos de “a cadeia da demo”, onde nós fazemos uma a outra de refém até às 3 da manhã, tocando nossas demos” diz Morris. “É mais ou menos como eu meço o som na cidade agora.
Morris nunca se esquivou de falar o que pensa, mas os últimos anos carregados de tensão a fizeram falar sobre questões como injustiça racial – tanto na música country, como no resto do país – e leis anti-transsexuais em seu estado natal. Algumas vezes, isso significou ter que reconsiderar suas palavras e expandir sua forma de pensar, quando pesssoas apontaram falhas em seus argumentos.
“Essas são as conversas difíceis que todos nós deveríamos estar tendo. Todos nós devemos ficar desconfortáveis” diz ela. “É assim que sabemos que estamos nos movendo e crescendo. Isso não significa que você é uma pessoa ruim. Significa que você é capaz de admitir quando esteve errado ou que você foi beneficiado por algo em que você é cúmplice e não sabia que era. Isso não é dizer que você não trabalhou duro pelo que tem.”
As Karens do Twitter provavelmente vão odiar, mas ela vai continuar fazendo música e falando o que pensa, muito obrigada. E ela vai se agarrar à compreensão de que ser humilde não significa necessariamente ter que pedir desculpa por ser ambiciosa e talentosa.
“É um teto tão curioso que só existe aqui de verdade. Eu não sei se é uma coisa de Nashville ou da música country, mas é engraçado comparar com artistas no pop e hip-hop, onde esse tipo de bravata é celebrado e não criticado da mesma forma” diz Morris. “É um tipo de check-in mental, tipo, ‘ei, não fique grande demais para os seus sapatos, mas também saiba que você é foda’”.
Tradução: Maren Morris Brasil